Fantasia selvagem e erótica, um teatro de dança implacável e desfile voyeurista formam “A Esposa de Tchaikovsky”

Por Eduardo de Assumpção*

“A Esposa de Tchaikovsky” (Zhena Chaikovskogo, Rússia/França/Suiça, 2022) O amor é cego, diz o ditado. Mas, no caso de Antonina Miliukova (Alyona Mikhailova), ela não apenas ignora o óbvio, mas acaba se entregando à loucura. Ao mesmo tempo, os rumores sobre as preferências sexuais de Pyotr Tchaikovsky (Odin Lund Biron), em Moscou, dificilmente poderiam ser ignorados e outros sinais, bem como as insinuações mal escondidas do próprio compositor também eram abundantemente claros.

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A jovem, no entanto, não está interessada em nada disso. Ela quer esse homem, ela quer se casar com ele e ser a esposa fiel ao seu lado, ela quer aliviar suas constantes dificuldades financeiras usando sua herança e nunca fazer suas próprias reivindicações. E assim o célebre compositor, finalmente concorda, especialmente porque os rumores podem finalmente parar.

Mas, rapidamente se torna evidente que o casamento é mais uma fachada. A própria vida conjugal basicamente não acontece devido às frequentes ausências de Tchaikovsky. Quando sua esposa se torna mais exigente, ele se afasta dela e finalmente envia amigos para informá-la do divórcio planejado, com referência à sua frágil saúde mental e física.

Então, como sua protagonista, o filme literalmente enlouquece, torna-se uma fantasia selvagem e também bastante erótica, um teatro de dança implacável e um desfile voyeurista.

O diretor Kirill Serebrennikov aborda a relação dupla e alienante entre Tchaikovsky, ampliando essa perdição amorosa através de um cenário obviamente clássico e uma singularidade na encenação que exclui estilo e maneiras educadas, ao contrário, implanta o filme em uma espécie de atmosfera sufocante e sepulcral, como um enterro.

Preferindo distanciar-se da cinebiografia formal, para isso há o excelente ‘The Music Lovers(1970)’, de Ken Russell, Serebrennikov decidiu destacar Antonina (o roteiro é em grande parte inspirado em suas memórias), para homenagear uma mulher presa em suas próprias paixões, rejeitando verdades e injunções, mas ultrapassadas pelas garras dos sentidos.

*Eduardo de Assumpção é jornalista e responsável pelo blog cinematografiaqueer.blogspot.com

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Twitter: @eduardoirib