Por João Geraldo Netto*
Mesmo com a inegável evolução nos métodos de prevenção contra a aids, como a PrEP e a PEP sexual, novos casos de HIV continuam crescendo no nosso País. Estima-se que cerca de 900 mil pessoas vivam com o vírus causador da aids e boa parte delas nem sabe do seu estado sorológico.
O tratamento também evoluiu muito e proporciona à pessoa HIV+ uma qualidade e expectativa de vida até melhores que de pessoas sem o vírus. Porém, o HIV ainda é considerada uma infecção grave e que mata cerca de 12 mil pessoas todos os anos no Brasil.
Nesse contexto, dias atrás, a deputada federal pelo PSL-SP Carla Zambelli fez uma postagem nas redes sociais associando a liberação de uma revista com um beijo entre dois homens ao aumento no número de HIV, como se o fato de ser gay fosse pré-requisito para se infectar com o vírus.
Primeiramente, é importante reforçar que o HIV é um microorganismo que pode infectar qualquer pessoa que faça sexo sem a proteção adequada, e que fazer essa ligação demonstra desconhecimento e desprezo pelos LGBTQI e pessoas que vivem com HIV.
Por outro lado, precisamos compreender que a epidemia de HIV atinge de forma desproporcional a população de gays e outros homens que fazem sexo com homens, assim como as travestis e mulheres trans, trabalhadoras(es) do sexo e pessoas que usam drogas.
É importante reforçar que o HIV é um microorganismo que pode infectar qualquer pessoa que faça sexo sem a proteção adequada.
Mas isso não se deve ao fato de sermos quem somos ou de um comportamento “promíscuo”. Está mais associado à falta de uma educação sexual adequada e ao preconceito e estigma que afasta essas pessoas dos direitos básicos, como a saúde. A discriminação contra essas populações é que as torna mais vulneráveis à infecção.
Uma moça trans, por exemplo, quando vai a uma unidade de saúde e é chamada pelo nome civil, desrespeitando a forma como gostaria de ser tratada, se afasta do sistema de saúde e fica, portanto, mais vulnerável a desenvolver e não tratar doenças.
E quanto mais conservadora e preconceituosa é uma sociedade, menos acesso à informação, saúde e educação essas populações marginalizadas terão. E a epidemia vai ficando ainda mais concentrada. Em países onde o estigma da aids não é tão grande, percebe-se uma redução drástica nos novos casos entre populações específicas.
O lado positivo em reconhecer a vulnerabilidade dos LGBTQI às infecções sexualmente transmissíveis (IST), é que podemos exigir políticas públicas específicas e o respeito à individualidade e características próprias de cada população. Negar que estamos mais propensos ao vírus, e alegar que isso aumenta o preconceito, demonstra incompreensão da complexidade que está por trás do vírus e corrobora para a tentativa de nos invisibilizar e nos eliminar.
Quanto mais conservadora e preconceituosa é uma sociedade, menos acesso à informação, saúde e educação essas populações marginalizadas terão.
É preciso entender, também, que o uso do discurso homofóbico e o ataque às pessoas que vivem com HIV é crime no Brasil e que a associação dessas questões, com a única tentativa de ofender e segregar pessoas, deve ser denunciada ao Ministério Público, delegacia de crimes cibernéticos e/ou movimentos sociais organizados.
O que não pode acontecer é ficarmos alheios a tudo o que está acontecendo, achando que isso nunca vai nos afetar. Até porque, a luta contra a aids não é apenas de quem vive com o vírus, mas de toda sociedade.
* João Geraldo Netto é comunicador, estrategista de marketing digital, gestor da informação, especialista em sexualidade e ativista LGBTQI e HIV.