Por Juju, a Gata*

Linda. Maravilhosa. Plena. Magnânima. Como essa luz me favorece, eu poderia morar neste canto da sala para o resto das minhas sete vidas. Olha esse sol favorecendo meu lindos pelos, como a natureza foi generosa ao unir todos os seus talentos para fazer um animal tão superior como eu. Inigualável. Nós, as gatas pretas, somos misteriosas, elegantes, clássicas, atemporais. Sempre copiadas, nunca igualadas.

– Concordo.

– Ah, você aqui de novo, Elvira. Pelo jeito vai mesmo morar na minha casa que eu empresto para o Hélio, não é?

– Foi o que ele disse. Eu gostei daqui e…

– Não goste tanto assim. Lembra da nossa conversinha? Eu mando aqui, você pode, no máximo, me obedecer e ficar quieta na sua. E estamos conversadas.

– Tá bem. Vou me lamber um pouco e dormir então.

Ótimo, saiu do meu cenário. Olha que coisa mais plasticamente perfeita eu em cima dessa sacola. Porque eu vejo que os humanos amam essas sacolas. Eles acham, não entendi ainda muito bem isso, eles acham que quem tem muitas sacolas na mão é superior. Algo a ver com uns papeis cheios de rostos que eles carregam e pelos quais brigam muito.

Quem quase tem a mão amputada de tanto carregar o peso dessas sacolas é visto como alguém com quem se deve ter uma amizade. Espécie estranha. No mundo dos gatos, o que mais vale é ser inteligente, perspicaz, saber esperar a hora certa para o ataque e estar sempre pronto para se defender. Eu não entendo como uma coisa de papel como esta pode dar poder a alguém.

Eles acham, não entendi ainda muito bem isso, eles acham que quem tem muitas sacolas na mão é superior. Algo a ver com uns papeis cheios de rostos que eles carregam e pelos quais brigam muito.

E eu percebi que alguns desenhos provocam mais frenesi do que outros. Essa espécie adora desenhos nas roupas. Também, nascem quase sem pelo nenhum para aquecer o corpo, aí ficam inventando isso de moda, corta daqui, estica dali, plissa acolá.

E aí eles colocam essas coisas que eles inventam dentro de um saco de papel que serve de escudo. Porque eu sou muito inteligente, eu percebo que alguns dessa espécie triste e atrasada usam essas sacolas para se defender, para alcançar algum patamar dentro dessa organização caótica dos humanos.

Será que eles nunca pensaram em deitar nessas sacolas? São tão deliciosas, toda vez que o Hélio chega aqui com uma eu fico feliz por dias e não deixo ele tirar do chão da sala. Que deliciosa a sensação dos meus pelos, os mais lindos do mundo, em contato com esse papel. Eu amo dormir por horas a fio durante o dia em cima delas.

São sonecas que me deixam bem descansada para durante a noite sair correndo pela casa, derrubando coisas, sendo eu, maratonando, mostrando meus atributos de ginástica olímpica. Chora, Daiane dos Santos, aqui é Juju, medalha de diamante (ouro é muito pouco para alguém como eu) em triplo carpado na janela da vizinha.

Lá vem o Hélio com o celular, é hora de brilhar. Ele congela minha pose maravilhosa e depois um monte de gente começa a dar coraçãozinho para essa beleza toda que sou eu. Reconhecem a oitava maravilha do mundo em algo que chamam de Instagram. Gente de vários tipos me ama, isso eu já esperava, não preciso da internet para saber.

Vai, arrasa, Juju. Empina a cabeça, lá vem a foto. Queixo 30 graus acima do horizonte para mostrar quem manda. Olhar penetrante, misterioso e com nuances de seriedade – porque eu não me dou ao desfrute. Lá vai, 1, 2, 3. Maravilhosa!

Eu percebo que alguns dessa espécie triste e atrasada usam essas sacolas para se defender, para alcançar algum patamar dentro dessa organização caótica dos humanos.

Olha só essa foto. Olha meus pelos nesta luz, olha que harmonia o meu corpo desenhado pelos raios solares. Como eu sou linda, quase não me aguento. Lá vem a segunda foto. Empina a cabeça e aiiiiiiiiiii!!! Sai daí! Saiiiiiii da minha fotoooooooo!

Minha vida nunca mais será a mesma!

*Juju, a Gata é uma coisa fofa peluda que está tentando se adaptar a conviver com outra gata como ela.

Parte I – A chegada de Elvira

Parte II – Nunca vi dia assim, tão feio e belo