Leona T solta a voz no YouTube para ser a referência trans que tanto lhe fez falta no começo da transição
Quem sabe faz a hora e não espera acontecer, então Leona T, de Taboão da Serra (SP), decidiu que era chegada a sua hora. A sua hora de ser referência na internet para pessoas trans que buscam neste infinito mundo virtual informações confiáveis, sérias, que possam transformar suas vidas. Um farol para se guiar.
Leona conta à Ezatamag que quando sua transição começou isso fez muita falta, essa referência ali de fácil acesso para ajudar a entender melhor o que estava acontecendo – e o que estava por acontecer. “Minhas maiores e únicas referências da vida eram as travestis que eu conheci na noite de São Paulo. Era tudo muito mais real e angustiante.”
“Libriana apaixonada com ascendente em peixes”, Leona é professora e tem 34 anos de uma vida que ainda tem muito para acontecer, já que, como ela mesma diz, a transição nunca acaba. Mas se este caminho é longo e cheio de obstáculos, tem gente como ela para dar uma ajuda valiosa.
Consciente de que a atual situação política brasileira não é nem um pouco favorável à população LGBT, ergue sua voz na internet para levar aquela palavra de “calma, está tudo bem. Será assim” que tantas e tantas pessoas trans necessitam todos os dias, criando assim o que ela chama de patrimônio travesti.
Saiba tudo:
“A ideia de criar vídeos para o YouTube surgiu de dois grandes anseios: a falta de informações reais sobre transição de gênero e a depressão que sempre tive e sofri muito na época, era uma válvula de escape para tentar encontrar pessoas que pudessem sentir o mesmo que eu.
Quando eu comecei a transição (há 10 anos) não existia nenhuma referência no YouTube, até porque o YouTube havia sido criado há pouco tempo, minhas maiores e únicas referências da vida eram as travestis que eu conheci na noite de São Paulo. Era tudo muito mais real e angustiante e as primeiras impressões que eu tive eram de que seria um caminho solitário e traumático.
Nós (pessoas trans) costumamos dizer que a transição nunca acaba, e é verdade (risos). A terapia hormonal é para sempre, mesmo com intervalos, e a disforia sempre nos incomoda. Eu realizei a cirurgia de redesignação sexual em 2018 na Tailândia e hoje me sinto mais feliz, menos incomodada com meu corpo e como vejo a mulher dentro e fora de mim. Ainda planejo realizar alguns procedimentos estéticos, pois me sinto ainda um pouco feia (risos), mas eu sei que pode ser uma encanação da minha cabeça.
Eu costumo dizer como professora há 16 anos que informação e conhecimento nos fazem expandir nossa percepção do que é o mundo. As pessoas precisam ainda se educar muito e trazer ainda mais o debate e principalmente a empatia para as vidas trans.
Muitos meninos e meninas trans e travestis me procuram para falar sobre o início da transição e sobre aceitação familiar (que é o grande mote da maioria) e o meu conselho pode parecer algo repetido, mas é a melhor das verdades: TEMPO É O QUE PRECISAMOS! Não adianta querer iniciar uma transição do dia para a noite e nem forçar a sua própria identidade se o seu interior ainda precisa estar em paz.
Pessoas trans já estão na linha de frente desde que o mundo é mundo. O grande problema social hoje é a valorização e significação dessas vidas, lutas e histórias para além do nosso quintal, além da nossa bolha. Hoje, por exemplo, faço um trabalho no Instagram de resgate histórico da memória transvestigênere com conteúdo muito bom e uma pesquisa séria para que possamos educar a todos sobre como todo movimento social importa e como cada individualidade deve ser apreciada e contada.
O governo atual está justamente na contramão desse pensamento e tenta diminuir ou apagar a nossa importância histórica dentro dos movimentos sociais. A Brenda Lee (ativista falecida que protegia e acolhia pessoas LGBTQIA+) disse uma vez que o que ela esperava no futuro que fizessem com a casa de apoio e com essa conscientização era justamente criar um PATRIMÔNIO TRAVESTI. Achei aquilo tocante e hoje é o meu mantra.
A quarentena para nós pessoas trans nunca foi novidade, num país que mais nos mata, temos que viver escondidas, soturnas, pensando e analisando cada lugar ou convívio que almejamos ter. A diferença agora é que temos que ter mais ainda uma saúde psicológica melhor para aturar tanto desprezo. Eu particularmente me desligo às vezes das redes sociais e tento me dar um presente: comer algo gostoso, ficar um dia vendo filmes, ler um livro indicado por amigos e seguidores e por aí vai.
Hoje meu maior sonho é conseguir ser reconhecida pelo trabalho que realizo na internet há anos e ser paga (risos). Eu carpi muito mato nessa net para muita gente e agora sinto que estou preparada para ter este retorno.”
Instagram @leonatreal