A identidade de gênero nas escolas precisa ser respeitada

Por Michelly Longo*

Assisti ao mais novo filme trans sensação do momento (“Alice Júnior”) e vi uma cena em que a atriz principal tinha seu nome social negado na chamada e proibida de ir ao banheiro feminino – e a diretora dificultou isso. Também já assisti algo igual na série “Segunda Chamada”, onde uma moça trans teve os mesmos direitos negados, algo que para mim foi incomum na minha época…

Alice Junior traz alguns dos preconceitos que ainda existem com alunes trans nas escolas

Me lembro que quando cursei o terceiro ano do Ensino Médio, em 2001, quando eu realmente transpareci a minha transgeneridade ao mundo (pois ninguém assume nada), uma colega pediu para os professores incluírem meu nome social na lista de chamada, pois era assim como ela já me conhecia. Todos na escola levaram tudo com muita naturalidade. Algo tão simples, mas que faz um bem tão grande a uma pessoa trans que tem o seu nome e gênero respeitados.

Linn da Quebrada em Segunda Chamada: direitos negados

Todas as atividades colegiais feitas por mim e até mesmo o banheiro eram de acordo a minha identidade gênero, e isso não foi problema algum para todos ao meu redor. Quando iniciei a transição fui muito bem acolhida por todos do colégio, claro que há tantos anos atrás é algo extremamente fora da realidade de muitas de nós nos dias atuais, disso eu não tenho do que reclamar, pois lá eu era quem eu sou de corpo e alma, completamente feliz, radiante!

Todos na escola levaram tudo com muita naturalidade. Algo tão simples, mas que faz um bem tão grande a uma pessoa trans que tem o seu nome e gênero respeitados.

No meio do ano letivo precisamos montar um desfile com coisas recicláveis, pois seria a nota do bimestre e me parece que estou naquele momento agora, vestida com uma saia de tecido dourado que fazia parte de uma cortina, usando um corselete confeccionado com um papel dourado, as minhas colegas de classe me fizeram uma maquiagem, toda no dourado… Eu estava linda, senti frio na barriga e medo, pois teria que desfilar para todo o colégio com plateia dentro do centro de cultura.

Foi então que já arrumada meu nome foi mencionado, escutamos: “E com vocês, ela, Michelly! ”.

Gostaria que todos, todas e todes tivessem o mesmo respeito nas escolas, é algo básico e crucial. Só quem é trans entende

Com a cara e a coragem fui, quando ultrapassei as cortinas… Com o olhar vidrado em um ponto fixo, sem prestar atenção em quem quer que seja, escutei uma voz gritando, “gostosa!”. Era um amigo meu e isso foi o impulso para muitos aplausos e todos gritando, me elogiando e apoiando, me emociona relembrar!

Chamariam hoje de privilégio, mesmo com tanto ódio e muito mais informação que antes, mas não era, foi exercido o meu direito de ser respeitada como a mulher que eu sempre fui e isso é inestimável. Gostaria que todos, todas e todes tivessem o mesmo respeito nas escolas, é algo básico e crucial. Só quem é trans entende e espero que um dia se torne real.

*Michelly Longo é ativista trans negra, baiana, cozinheira de profissão, casada e cheia de boas experiências para compartilhar.