Diálogo sobre a transfobia criminal e recreativa presente nos meios de comunicação Por @agatapauer
A empresa de mídia e notícias da região dos lagos, RLAGOS NOTÍCIAS (@rlagosnoticias), coordenada pelo Glauber Henrique Ribeiro, sendo este individuo homem, cis, hétero e branco, nesta sexta-feira (16), cometeu em suas redes sociais uma transfobia de cunho recreativo e criminal contra a Hagata dos Santos, moradora de Cabo Frio, a acusando de ser autora de um homicídio, tendo como vítima um idoso, na Praia da Palmeiras, no município de Cabo Frio.
Segundo a ONG Grupo Iguais, Hagata foi vítima de um jornalismo que potencializa a incitação de ódio a corpos transvestigêneres e dissidentes. Isso por que, este veículo de imprensa disseminou Fake News sobre o caso: “Travesti aí… Vai ser levado pra 126ºDP onde vai ser preso e o corpo será levado para o IML de Cabo Frio. […] O travesti estuprou ele até a morte, tentou jogar o corpo para acobertar o crime, como ele viu que o idoso tinha morrido, o travesti jogou o corpo dele dentro da lagoa para tentar desfazer o crime”, afirma o próprio jornalista e coordenador, Glauber, em uma live na plataforma do Facebook.
Entretanto, tal afirmação não se sustenta e não possui veracidade para comprovar toda essa teoria da conspiração. Na realidade, acontece que, segundo a mesma organização não governamental de Cabo Frio, “o idoso e a travesti mantinham relações sexuais no momento em que o homem começou a apresentar sinais de mal súbito, em decorrência da ingestão de medicamentos e demais substâncias. Hagata retirou o homem da água e pediu socorro aos pescadores que passavam pelo local, informações que foram completamente omitidas durante a transmissão ao vivo realizada pelo veículo citado.”
Hagata retirou o homem da água e pediu socorro aos pescadores que passavam pelo local, informações que foram completamente omitidas durante a transmissão ao vivo realizada pelo veículo citado.
Isto quer dizer que, seu conteúdo é a reconstrução e propagação de um imagético social onde a travestilidade é vista e reconhecida em condições diabólicas e desviantes. Apenas sendo a que anda com navalha debaixo da língua, sem reconhecer a historicidade de tal ato, e como prostituta e traficante. Sendo importante relembrar que casos como esses têm cunho sensacionalista, a partir do momento que todos foram ensinados a ver tal existência nessas condições.
A visibilidade apenas ocorre em casos onde nossos corpos são colocados como agressores, o que não diverge do jornalismo “Cidade Alerta”, que carrega consigo inúmeras transfobias e discursos que naturalizam e/ou compactuam com a violação dirigido ao corpo dessas pessoas.
Logo, este ocorrido com o RLAGOS não é recente e muito menos isolado, o mesmo meio de comunicação cometeu em outra cobertura no dia 6 de junho, de 2020, uma Fake News. Adotou uma narrativa problematizadora e de culpabilização às mulheres trans e travestis que se prostituem.
Como estávamos e estamos em uma realidade pandêmica, a matéria questionava o fato de que, “se não pode aglomeração nas ruas, como essas travestis ficam nas esquinas da cidade parecendo umas desocupadas e prejudicando pessoas de bens.” (RLAGOS, Ponto de prostituição de travesti está sendo usado para espancar e assaltar as pessoas em Cabo Frio, 2020).
A visibilidade apenas ocorre em casos onde nossos corpos são colocados como agressores
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Toda essa vertente inibe e desconsidera a realidade de empregabilidade, escolarização e dignidade dada a corpos transvestigêneres. Se 90% dessa população se encontra vulnerável à prostituição, é por conta de uma estrutura cisheteronormativa que dita o nosso caminho. Tendo como exemplo a nossa expectativa de vida, que segundo a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), é de 35 anos.
Ou, casos em que 82% sofrem exclusão escolar e 0,02% se encontram no ensino superior. O que reflete no Brasil liderar por treze anos consecutivos o ranking mundial como o país que mais mata pessoas trans e travestis. Desta forma, a prostituição, e esse ponto citado pelo jornalista da matéria, não é um lugar de desocupação, muito pelo contrário, de chacina dos nossos corpos.
Se tornando uma prisão para os nossos corpos que não podem ter oportunidades, senão essa. Principalmente em Cabo Frio, cidade onde existem inúmeras mulheres trans e travestis, mas que políticas públicas e projeto de lei não são acionados.
Logo, mídias de comunicação como a do RLAGOS, são responsáveis pela sustentação de ideias que ferem nosso direito de ser e que ameaça a nossa existência. Não é apenas Fake News, é um projeto de higienização e uma relação de poder institucionalizada entre a cisgeneriedade e transvestigeneriedade.
*Ágatha Pauer é criadora de conteúdo, atriz e travaturga, estudante do @iffcampuscabofrio e ex-bolsista do projeto de arte e cultura. Atualmente é coordenadora do movimento de mulheres da RL e filiada ao @gruposguais.