“Julieta” reafirma o poder que Almodóvar exerce no controle total sobre o seu trabalho, maduro, refinado e marcado por beleza e sutilezas.
Por Eduardo de Assumpção*
“Julieta” (Espanha, 2016), o vigésimo filme de Pedro Almodóvar, sem dúvida não é sua maior obra-prima, mas reafirma o poder que o artista exerce no controle total sobre o seu trabalho, maduro, refinado e marcado por beleza e sutilezas.
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Como a maioria dos filmes do diretor, este centra-se nas mulheres. Sua premissa narrativa pode ser simplesmente declarada: uma mulher enfrenta o doloroso mistério do longo afastamento de sua filha. Mas este é apenas um fragmento de um drama que cresce firmemente mais rico, mais ressonante e complexo como o cineasta elabora.
Julieta (Emma Suárez), uma mulher de meia-idade e de classe média, planeja mudar-se para Portugal com o namorado Lorenzo (Darío Grandinetti), que quer discutir seus próximos passos. Mas esta é uma fuga que não é. Quando a protagonista encontra Bea (Michelle Janner) casualmente na rua e fica sabendo notícias de sua filha desaparecida, Antía, ela resolve ficar em Madri, e esperar por notícias.
Três décadas antes, Julieta (agora Adriana Ugarte), uma professora de Literatura , sai em uma viagem de trem noturna que vai mudar sua vida. Quando um homem mais velho tenta conversar, ela foge para o bar, onde conhece Xoan (Daniel Grao), um jovem pescador bonito. Os dois fazem amor naquela noite, mas algo mais acontece: o homem que ela conheceu comete suicídio – criando uma centelha de culpa que levará outras formas mais tarde na história.
É uma história que varia ao longo de muitos anos e várias localidades. Quando Julieta se muda com Xoan para sua linda casa à beira-mar, ela encontra a vida complicada pela proximidade de uma bela artista, Ava (Inma Cuesta) e a governanta Marian (Rossy de Palma), que parece para se ressentir da felicidade de qualquer outra pessoa.
Julieta e Xoan têm uma filha, Antía(Priscilla Delgado\Blanca Pares), que tem uma infância feliz. Mas depois que a interrupção da família impulsiona uma mudança para Madri quando a garota é adolescente, um abismo começa a abrir entre ela e sua mãe, por outro lado, os laços com a amiga, Bea (Sara Jiménez) que conheceu no acampamento só se estreitam.
Onipresente, o vermelho aparece elegantemente em objetos, como toalhas, carros e roupas. Mas há um grande cuidado com a escolha das obras de arte, junto com a fotografia de Jean-Claude Larrieu, edição de José Salcedo e trilha de Alberto Iglesias, cuja atmosfera de mistério acompanha o filme. Há também uma grande cena, que marca a transição das duas atrizes que interpretam Julieta.
O roteiro de Almodóvar foi baseado em três histórias da escritora canadense Alice Munro, mas se conecta intrinsecamente com sua cultura espanhola, bem como as ideias expressas em seus filmes anteriores, com comidas, cozinhas e diálogos muito característicos. Além de traçar um novo curso em sua carreira, “Julieta” é impregnado de feminilidade com a confiança casual de um mestre do cinema.
*Eduardo de Assumpção é jornalista e responsável pelo blog cinematografiaqueer.blogspot.com
Instagram: @cinematografiaqueer
Twitter: @eduardoirib