Almodóvar resgata em “Dor e Glória” sua infância, a relação com a mãe e os vícios e bloqueios

Por Eduardo de Assumpção*

“Dor e Glória” (Dolor y Gloria, Espanha, 2019). Após se auto referenciar ao longo de sua filmografia recente, o diretor espanhol Pedro Almodóvar apresenta em Dor e Glória seu filme mais íntimo, onde se entrega ao público mostrando a si mesmo em uma espécie de autorretrato. Além do personagem central, Salvador Mallo, ser um alter ego de Almodóvar, interpretado com bravura por Antonio Banderas, indicado ao Oscar, resgatando a infância do diretor, sua complexa e próxima relação com a mãe, seus bloqueios e vícios.

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A propósito, a morte da mãe do cineasta lhe provocou um bloqueio criativo, isolamento e solidão que resultaram em Dor e Glória. A figura da mãe é interpretada brilhantemente por Penélope Cruz e pela veterana Julieta Serrano. É essa mãe de Penélope que protagoniza uma das sequências mais belas do filme, onde mulheres lavam roupa no rio enquanto cantam. A cena têm participação da cantora Rosalía e em muito remete ao neorrealismo italiano e os filmes de Fellini.

Não é a primeira vez que Pedro Almodóvar traz um diretor de cinema como protagonista, isso já aconteceu antes em A Lei do Desejo, Má Educação e Os abraços partidos, mas é desta vez que fica mais evidente que ele está falando de si mesmo, trazendo inclusive fatos conhecidos do público como quando cantava vestido de mulher em uma banda punk nos anos 80 e até mesmo por arquivo fotográfico.

Um dos personagens que centraliza a paixão de Salvador é Federico interpretado pelo argentino Leonardo Sbaraglia. Quanto às tão conhecidas cores de Almodóvar, o vermelho está lá e se faz sempre presente mesmo que este não seja um filme colorido como estamos acostumados em sua cinematografia, a fotografia de José Luis Alcaine se mantém sublime.

Há também muito mais drama do que seu característico humor o que qualifica a obra com um tom melancólico. Com Dor e Glória Almodóvar faz um filme lindo, cheio de momentos delicados e memoráveis. É um resgate à sua vida, seus sucessos, devaneios e fracassos. A 21ª obra do diretor pode causar certo estranhamento no início mas é um deleite para qualquer fã que vê na tela seu ídolo mostrando vulnerabilidade.

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*Eduardo de Assumpção é jornalista e responsável pelo blog cinematografiaqueer.blogspot.com

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Twitter: @eduardoirib