Dois pais homoafetivos e três adoções necessárias (Parte II)
Por Toni, David, Alyson, Jéssica e Filipe Harrad Reis*
Em 5 de maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por unanimidade que para os efeitos da lei a união estável entre casais homoafetivos há de ser considerada igual à união estável entre casais heterossexuais. Essa decisão tem desdobramentos no campo da adoção também.
Em junho do mesmo ano, tivemos a oportunidade e a felicidade de fazer uma palestra sobre adoção por casais homoafetivos no XVI Encontro Nacional de Apoio à Adoção, em Curitiba.
Lá conhecemos uma juíza do Rio de Janeiro que estava bastante sensibilizada com o nosso caso. Passados alguns meses, recebemos um telefonema dizendo que essa juíza tinha sob seu cuidado um menino de 10 anos que talvez se daria bem conosco e nos convidando para conhecê-lo.
Após certa hesitação, visto que o menino – Alyson – não era da idade que tínhamos imaginado, aceitamos e passamos dois dias com ele no Rio de Janeiro no mês de setembro de 2011.
Alyson relata que quando falaram para ele na Vara da Infância que havia um casal gay que estava querendo adotar, no começo disse que não queria conhecer, muito menos ser adotado por eles. Mas com o tempo foi se acostumando com a ideia e finalmente aceitou nos conhecer.
Fomos primeiro ao Fórum onde a psicóloga responsável pelo caso de Alyson relatou os principais pontos do seu histórico. Em seguida fomos apresentados a Alyson e passamos juntos uma tarde agradável.
Alyson relata que quando falaram para ele na Vara da Infância que havia um casal gay que estava querendo adotar, no começo disse que não queria conhecer, muito menos ser adotado por eles.
No início da noite, levamos Alyson de volta para a casa da família acolhedora com quem estava morando. Na manhã do dia seguinte, ao ir buscá-lo, tivemos uma conversa bastante demorada com a mãe e o pai acolhedores e estes deram suas opiniões sobre Alyson e a história dele.
Almoçamos no centro do Rio de Janeiro com Alyson e um casal de gays amigos nossos. No tempo que nós, Toni e David, passamos sozinhos com o Alyson durante a visita, tivemos uma ótima impressão dele e já estávamos com vontade de adotá-lo.
Alyson diz que a impressão que ele tinha de gays era de pessoas nojentas e horrorosas. Com a aproximação a nós e nossos amigos, afirma que inicialmente se sentiu bem e mal ao mesmo tempo, porque nunca tinha convivido com gays.
Diz que com o tempo foi “percebendo que são muito melhores que pensava e adorou”, acrescentando que agora os ama. Para não interromper os estudos de Alyson, resolvemos que seria melhor ele vir morar conosco definitivamente apenas em dezembro, após o fim do ano letivo. Com o intuito de manter o contato frequente com Alyson, compramos um celular para ele.
Fomos um tanto ingênuos nesse sentido, o celular serviu mais como brinquedo e em poucos dias ele pôs uma senha que depois não conseguiu desbloquear, de modo que não deu certo a nossa ideia de ter o celular como um meio de comunicação direta entre nós. Mesmo assim, ligávamos quase que diariamente para ele nesse período por meio do celular da mãe acolhedora. Sentíamos muita saudade.
Durante o período de habilitação para adoção e subsequente espera, lemos vários livros sobre o tema e participamos de vários cursos de preparação para adoção, tanto de crianças mais novas como mais velhas, inclusive com depoimentos de pais e mães adotivos quanto às suas experiências com a adoção tardia.
Ligávamos quase que diariamente para ele nesse período por meio do celular da mãe acolhedora. Sentíamos muita saudade.
Como resultado, sabíamos que a adaptação poderia ser um processo marcado por algumas dificuldades, principalmente a questão de a criança querer testar os limites.
Um mês depois de conhecê-lo, Alyson veio passar uma semana conosco, para nos conhecer melhor, conhecer Curitiba e amigos e conhecidos também. Nessa visita, a convivência com Alyson foi muito boa na maioria dos aspectos, mas também tivemos situações de birra e frustração quando ele não podia fazer tudo do jeito que queria.
Foi muito importante ter tido a oportunidade prévia de participar nos cursos para não ser pegos de surpresa com esses comportamentos.
Mesmo assim, saber lidar com eles não foi tão fácil inicialmente, talvez porque nunca tínhamos sido pais e nós também estávamos passando por isso pela primeira vez. Por sua vez, Alyson afirma que se deu bem na visita e se sentiu feliz.
Diz que foi aí que começou a gostar de nós.
*Toni Reis é pós-doutor em Educação, presidente da Aliança Nacional LGBTI+, pai de Alyson, Jéssica e Filipe e marido do David
Leia a Parte I clicando aqui.