“Os Primeiros Soldados” trata de um tema até então pouco explorado no cinema nacional: o início da epidemia da AIDS

Por Eduardo de Assumpção*

“Os Primeiros Soldados” (Brasil, 2021) É 31 de dezembro de 1982. O biólogo Suzano, Johnny Massaro, está de volta à Vitória, na casa da irmã Maura e do sobrinho Muriel após uma temporada em Paris. O personagem já começa a apresentar sintomas, de algo que ele sabe que contraiu, e se prepara para a proximidade da morte. Os Primeiros Soldados, de Rodrigo de Oliveira, descentraliza a ação do eixo Rio-SP, e nos leva para o Espírito Santo, para tratar de um tema até então pouco explorado no cinema nacional: o início da epidemia da AIDS, e faz isso de forma nunca antes vista.

Leia também:

‘Abracadabra 2’ deve todas as gerações prestando homenagem ao original e adicionando atualização gentil e diversidade

‘Hellraiser’ reimaginado é interpretado com grande sucesso como uma história dos efeitos do vício

“Mais que Amigos” pretende transformar o arcaico e mostrar que hoje as coisas já não são bem assim

Em seu primeiro grande papel no cinema, Renata Carvalho se destaca como Rose, ela surge em cena dizendo que ‘travesti não é bagunça’. Ela, que sonha em ser a Blanche, em Um Bonde Chamado Desejo, brilha em diversos momentos, especialmente quando apresenta e performa uma inusitada canção na Festa de Ano Novo. “Festa de entendido não se dispensa”, diz Joca, o ex de Suzano, resgatando as gírias do passado, e que quer reatar, mas não sabe que algo pode estar acontecendo.

Por outro lado Humberto, um videomaker, está acompanhando os passos de Rose, enquanto demonstra um interesse por Jean. Mas oito meses após a noite de Réveillon, nada mais será o mesmo. Suzano informa a família que voltará para Paris, Rose e Humberto desaparecem, e o que vinha sendo documentado como um show, acaba se tornando o registro dos sintomas e da evolução dos primeiros impactados pelo HIV, no sudeste brasileiro.

A narrativa, não completamente linear, nos permite acessar esses momentos de felicidade, que são acompanhados pela trilha original de Giovani Cidreira junto à clássicos de Secos e Molhados, 14 Bis, Fernando Mendes e Gonzaguinha, ao convívio do grupo LGBTQIA+ tentando se adaptar e descobrir mais sobre essa sua nova condição.

“Eles tentam nos matar desde que o mundo é mundo e o que a gente faz é sobreviver, sendo linda”, diz Rose, num dos momentos mais inspirados do roteiro de Oliveira. Os Primeiros Soldados, é claro que não proporciona um final feliz, mas sim uma reflexão sobre aqueles que iniciaram e perderam essa guerra invisível, para que outros pudessem triunfar no futuro.

Disponível nos canais @globoplay.

*Eduardo de Assumpção é jornalista e responsável pelo blog cinematografiaqueer.blogspot.com

Instagram: @cinematografiaqueer

Twitter: @eduardoirib