Fotos: Mamba Negra
Festa Mamba Negra retorna ao presencial em São Paulo derrubando de vez rótulos de gênero e o carão na balada
A Mamba Negra se descreve como “serpente venenosa com hábitos noturnos libidinosos. Bote rápido e fatal. Arena eletrônica de paralisergia”. E é assim tão sincera como todo o resto de seu conceito, do grande e profícuo universo que construiu em volta de si. Festa, acontecimento, loja, lounge, terapia, casamenteira musical, espaço de liberdade, oásis contra a hipocrisia. Aquele caos que todo mundo precisa para achar certa ordem, mas uns dois dias depois de sair da pista.
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O retorno presencial foi no último sábado, dia 9, na Fabriketa, em São Paulo, reforçando uma festa essencialmente negra, totalmente destituída de rótulos de gênero e completamente livre – a festa em si, as pessoas, as atrações, o som, o figurino ou a falta dele. Gente montadíssima, gente montada, gente, gente e só, seres humanos.
Mamba Negra é salto-alto, bota, coturno, sandália, pé no chão, tênis. É tudo o que você achar confortável para cair na pista, ficar em cima de algum palquinho, sentar, beijar, olhar, apenas ser. É um espaço que comprova: um novo mundo finalmente vem surgindo – e ele é liberto de roupas de marcas famosas, arrogância, prisões de convenções sociais, amarras sexuais. Ele nunca mais será preso a convenções de binarismo.
É neste delicioso e muito dançante caos musical que Monna Brutal subiu ao palco no sábado. Rima, poesia, força, raça, vontade, talento. Colocou muita gente para dançar enquanto fazia também muita gente pensar. Afinal, no novo mundo, o divertido é aprender sempre, em todo lugar, com todas as pessoas – e muito mais com uma travesti negra que fala o que pensa.
Uma maré de ráfia vermelha cruza sua cabeça, alguém desce até o chão atrás de você gritando “uhuuu”, outra pessoa te paquera – tem ainda uma em cima do palquinho de olhos fechados.
No outro palco, as Irmãs de Pau cantaram sobre o desejo que a sociedade proíbe com sua hipocrisia. Bradavam que se você quer usufruir daqueles corpitchos deliciosos, ah, amor, vai ter que assumir para a família. Não há mais lugar para esconderijos, ninguém mais quer ficar no cantinho escuro. Aqui, monamour, é todo mundo na pista, de peito aberto, exposto.
Dançando, beijando, rodando, batendo cabelo e tanta coisa mais que é impossível descrever (por isso a galeria de fotos acima inclui imagens de outras edições). Uma maré de ráfia vermelha cruza sua cabeça, alguém desce até o chão atrás de você gritando “uhuuu”, outra pessoa te paquera – tem ainda uma em cima do palquinho de olhos fechados deixando o gostoso veneno da Mamba passear pelo corpo, pela alma.
É inegável o efeito da picada, que começa já antes de você entrar neste sedutor covil. A divulgação de cada edição é um show de arte, com uma identidade capaz de traduzir o sentimento da festa. É luz, cor, grafismo, prateado, ondas, vermelho, paixão e calor.
Sim, ainda se vê o que até ontem se chamava de pessoas padrão. Mas estas muito cientes de que no novo mundo não existe mais degraus entre uma pessoa e outra. Acima de nós está somente a música, rápida, animada, nervosa, feita por gente talentosa, rasgando o ar que vai sendo vacinado contra a Covid (a festa exigia comprovante de vacinação).
Não há mais degraus. Não há mais marcas. Os rótulos caíram. O carão não dá mais as caras. Pelo menos nesse torpor maravilhoso que é levar uma picada da Mamba Negra você pode se entregar para si mesmo. Ninguém vai julgar.