“Peter Von Kant” funde a essência de François Ozon e Rainer W. Fassbinder

“Peter Von Kant” (França, 2022). No começo dos anos 2000, François Ozon mostrou sua devoção pelo mestre do Novo Cinema Alemão, Rainer W. Fassbinder, adaptando “Gotas D’Água em Pedras Escaldantes”, uma de suas peças nunca encenadas. Desta vez, Ozon celebra Fassbinder em uma versão livre de “As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant” (1972), que funde a essência dos dois artistas.

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O filme de Fassbinder se passa inteiramente no apartamento de uma estilista que tem um relacionamento emocionalmente abusivo com sua assistente, e então concebe um amor louco e desesperado por uma bela jovem que a trai abertamente. Ozon faz alguns desses personagens homens, mas apenas alguns.

Ao trocar o gênero e a profissão do protagonista, de estilista para cineasta, Ozon e o ator Denis Menochet, em uma performance tour de force, personificam o próprio Fassbinder, inclusive em maneirismos e compulsões. Peter von Kant é uma criatura fascinante e excêntrica, um homem condenado à autodestruição por seu próprio egocentrismo melancólico. Em Colônia, da década de 1970, o filme abre com Karl, o assistente submisso e humilhado de Peter Von Kant.

Ambos coexistem em uma espécie de unidade complementar no microcosmo ornamentado que é o apartamento, praticamente a única locação do filme. Um dia a atriz e cantora Sidonie, maravilhosamente interpretada por Isabelle Adjani, em alusão à Ingrid Caven, apresenta seu amigo Peter ao jovem Amir, por quem o diretor se apaixona e sucumbe.

Amir, o inexperiente e tímido objeto de desejo, representa o reverso do perturbado Von Kant: um garoto atlético, sem instrução e órfão; banal e hedonista, mas faminto de ser, de existir na retina da lente, na memória coletiva. Von Kant promete o mundo a Amir, em troca de seu corpo e declara um amor histérico por ele. Com sua homenagem sempre divertida, François Ozon reverencia não só ao diretor alemão, mas também a cultura cinematográfica.

Amantes do cinema vão adorar as inúmeras referências à clássicos da história da sétima arte que percorrem o longa. Ao mesmo tempo, Peter Von Kant não é uma reverência cega à Fassbinder, mas um tributo irônico.

*Eduardo de Assumpção é jornalista e responsável pelo blog cinematografiaqueer.blogspot.com

Instagram: @cinematografiaqueer

Twitter: @eduardoirib