Clássico de Almodóvar, “Que Fiz Eu para Merecer Isto?” mistura fetiches e absurdos para discutir a submissão da mulher
“Que Fiz Eu para Merecer Isto?” é um filme de Pedro Almodóvar feito há 38 anos (1984) que ainda perturba, que bom. O mestre espanhol mistura fetiches sexuais explícitos e implícitos, discussão sobre machismo e submissão da mulher, homossexualidade, drogas, um assassinato e a reviravolta na vida da protagonista, Gloria – interpretada “apenas” por Carmem Maura.
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É ela quem guia o fio condutor narrativo que em um primeiro momento pode parecer um sonho ou bad trip de tão confuso. Mas tudo faz sentido ao contar a história desta dona de casa que vive em Madri (Espanha) com o folgado e agressivo marido Antonio (Ángel de Andrés López) e uma sogra (Chus Lampreave) que resume o clichê de tal relação.
Almodóvar faz um filme representando como a opressão da mulher é diariamente perpetuada, até que elas saem do controle (deles) e começam a agir como sempre quiseram.
Gloria divide o apartamento de classe média baixa ainda com dois filhos: Toni (Juan Martinez) é traficante, já Miguel (Miguel Angel Heranz) é doado a um dentista pedófilo porque as condições financeiras da família ficam melhores com menos este “gasto”. É preciso lembrar que Almodóvar tem como marca registrada elevar ao absurdo a discussão para depois esmerilhá-la.
O filme pode parecer comédia, não deixa de ser, mas traz uma história de desilusão que começa já com Gloria tentando trair o marido com o Polo (Luis Hostalot), o detetive que investiga o assassinato de Antonio e está passando por problemas de ereção – o patriarcado não tem mais tanta força.
Em uma corrente cheia de elos disformes, Almodóvar liga tudo ao mesmo tempo após a morte principal do enredo. Polo busca ajuda psicológica e, como tratamento, precisa exercer seu desejo (porque o patriarcado engessa), optando pela ajuda da profissional do sexo Cristal (Verónica Forqué), vizinha e álibi de Gloria, assassina de Antonio.
Soma-se a todos estes acontecimentos uma crise de abstinência de Gloria, que adora calmantes, mas está sem receita médica para comprá-los. Este é o clima que ronda todo o longa, a expectativa de que a qualquer hora tudo pode explodir e não ser mais como era, seu marido está morto, sua sogra está finalmente indo embora, seus filhos não estão mais sob sua batuta…
É com tudo ao mesmo tempo agora que Pedro Almodóvar faz um filme representando como a opressão da mulher é diariamente perpetuada, até que elas saem do controle (deles) e começam a agir como sempre quiseram. É como se o cineasta dissesse: ela matou, mas ele mereceu isso.
Disponível na Netflix, Amazon Prime Video, YouTube e Apple TV.