Rainha das festas juninas do Piauí, Sheron Lumynes promete manter a tradição mesmo com o isolamento social

Olha para o céu, meu amor. Veja como ele está lindo. Pula a fogueira. Olha a chuva! Cai, cai balão. Saudades de uma festa Junina, né minha filha? Imagine então como está apertado o coração de Sharon Lumynes, que tem o São João como uma das datas mais importantes de sua carreira como drag em Teresina.

Criada pelo libriano “meio indeciso” Vinícius Alves, de 23 anos, Sharon está desolada com o isolamento que impede as festas juninas, mas não perde a alegria e conta à Ezatamag que, mesmo em casa, coloca sua saia, aumenta o som e cumpre a tradição junina.

Apresentadora, Top Drag Piauí, Rainha G do Carnaval, Rainha G Junina Piauí, Rainha G Junina Mossoró e Princesa G Junina Brasil, Sheron é um símbolo junino piauiense que se dedica às quadrilhas com todo seu coração – sem esquecer de uma produção caprichada e make elaborada.

Uma paixão pelo feminino que vem desde quando Vinícius tinha 12 anos. “Lembro que gostava muito de Joelma e Companhia do Calypso, aiiiiiii era tudooooooo. Eu sempre era a vocalista principal, jogava a toalha como se fosse meu cabelo”, revela na entrevista a seguir:

Como é a realidade para os LGBT em Teresina?

Umas olhadas, uns “coió” e até mesmo agressões rolam. Isso é quase que inevitável, principalmente vindo do Nordeste, uma terra na qual somos ensinados a ser o “homem” da casa, em uma sociedade onde os LGBT são vistos como aberrações e um monte de adjetivos terríveis. Há intolerância sim, mas felizmente estamos progredindo para reverter essa situação nada agradável. Precisamos de mais apoio do governo com projetos, leis e programas que asseguram a nossa proteção e diretos, incentivo do mercado, pois tem discriminação sim com os contratados, seja ele gay, negro, gordinho. O preconceito fala mais alto. Precisamos de uma conscientização também maior de famílias e de um todo, a fim de acabar com essa intolerância e a falta de oportunidade, seja ela de emprego e até mesmo do livre arbítrio de andar pelas ruas.

Lembro que gostava muito de Joelma e Companhia do Calypso, aiiiiiii era tudooooooo. Eu sempre era a vocalista principal, jogava a toalha como se fosse meu cabelo hahaha era um luxo na minha cabeça.

Como foi esse processo de ser a Sheron? Você enfrentou muitas dificuldades?

Eu comecei a me transformar em 2013, brincando na folia do Carnaval com amigos e as minhas manas, mas desde de criança, por volta dos 12 anos, me achei feminina, sabe? Aquela vontade de ter um cabelo grande, aquela vontade de passar um batom, usar uma roupa feminina. Lembro que gostava muito de Joelma e Companhia do Calypso, aiiiiiii era tudooooooo. Eu sempre era a vocalista principal, jogava a toalha como se fosse meu cabelo hahaha era um luxo na minha cabeça. E desde de lá sempre quando posso me transformo. É muito incrível que tudo desde sempre foi se encaixando. Desafio sempre tem, seja numa maquiagem, roupa ou até mesmo em casa com sua família. Eu costumo dizer que nada nessa vida é fácil, tudo vem com bastante esforço e desafios. Mas graças a Deus eu tenho uma mãe maravilhosa sabe? Ela, claro, no início deu um show e disse que não me aceitaria daquela forma (drag), falava que não precisava ser gay e virar mulher. Mas hoje tenho uma gratidão enorme por ela, sempre positiva quando o assunto é Sheron, sempre fala que sou linda e que vou sim vencer, fala até que um dia vou ser famosa kkkkk. Só digo amém. Ela fica encantada comigo falando, sorrindo, às vezes fico até meio envergonhada, pois é muito incrível essa mudança dela comigo Sheron. Mas um dos maiores desafios foi aprender a me maquiar. No início é muito, muito complicado. Hoje em dia graças a Deus eu aprendi. Conto com pessoas maravilhosas que sei que se eu precisar elas irão sim me maquiar e fazer o que estiver ao alcance delas. Isso não se paga, agradeço muito a Deus por ter pessoas tão incríveis por trás das câmeras. O conselho que deixo é não desisti, persistir e ter muita humildade, é a chave para abrir os caminhos. Claro que o principal deles é ter Jesus em seu coração, ser um boa pessoa, ajudar quando é preciso, ter uma boa índole, isso é mais do que necessário.

Um dos maiores desafios foi aprender a me maquiar. No início é muito, muito complicado.

Você acha que bons exemplos podem inspirar outras pessoas a serem mais felizes?

Sim eles inspiram sim. Muitos veem e falam “poxa, mas que incrível”. Contudo, vai da pessoa também lutar pelos seus objetivos. Ficar parado não vai levar ninguém a lugar nenhum, basta ter foco e se dedicar e com um pouco de sorte tudo no tempo de Deus irá se cumprir, e se não for é por que não era da vontade dele.

Eu vi que você ama Festa Junina e ganhou vários concursos. Como tem sido esse período para você com a gente isolado?

Ahhhhh gente! O São João. Esse com certeza é o período mais incrível da minha vida. A sensação que tenho é de tristeza, muito infeliz por ver que o período que mais amo está arriscado a não acontecer, mas entendendo sim a necessidade do isolamento, com uma dor no peito. Agora é esperar quando tudo isso vai passar e, enquanto não passa, sigo aqui, botando a caixa de som no volume máximo, colocando minha saia e imaginando como será mais incrível ainda o São João de 2021.

Ainda temos muito a fazer para conquistar uma sociedade mais tolerante?

Ainda são necessárias muitas conquistas no âmbito de nossa sociedade, é notório as grandes conquistas que nossa classe já teve, mas precisamos e merecemos mais, pois não é normal ser destratado por ser e se sentir diferente. Até porque devemos ser empáticos com o próximo. Dessa forma prevalecerá apenas amor e respeito em uma sociedade tão obscura e cheia de preconceito.

Qual seu sonho?

Eu tenho um sonho cheio de metas: alcançar uma estabilidade financeira, ter um bom emprego, me formar, casar, ter minha casa, meus negócios, poder ajudar minha família a crescer também. Viver em uma nação mais humana, com líderes justos e que deem mais atenção aos pobres e aos que mais necessitam. Uma sociedade menos hipócrita e um mundo melhor.

Instagram @sheronlumynes