“A Cor Púrpura” continua sendo um dos mais importantes filmes sobre o amor LGBT+ e o racismo
Assistir “A Cor Púrpura” é um soco no estômago necessário em um Brasil que chama de mimimi a solidão da mulher negra, que apaga a população LGBT+, que nega o racismo. Com um remake musical anunciado neste ano e em produção, o filme de Steven Spielberg de 1985 infelizmente é atual em seus temas, ainda incomoda pelas cenas que ainda podem ser de hoje em dia, continua fazendo chorar rios dos olhos de quem tem um mínimo de empatia.
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São 40 anos da vida de Celie (Whoopi Goldberg) muito, muito difíceis. Por isso o roteiro de Menno Meyjes é inteligente ao reservar um pouco de respiro ao telespectador logo no começo. Só um pouco, algumas cenas de humor para amaciar uma sequência de tragédias que começa ainda com a protagonista sendo abusada pelo pai, separada dos filhos e casada contra sua vontade com Albert (Danny Glover).
Ao lado da irmã, Nettie (Akosua Busia), Celie ainda conseguia ter alguns momentos de alegria. Mas tudo acaba porque mais uma vez o homem acha que tem poder sobre o corpo da mulher. As irmãs são separadas após uma tentativa de estupro, seguida de uma fortíssima cena que anuncia um tom (ainda) mais dramático.
O passar do tempo traz novas personagens, como o furacão revoltoso Sophia, maravilhosamente interpretada por Oprah Winfrey, que vai produzir o remake ao lado de Spielberg. Ela se torna a empregada da esposa do prefeito da cidade, Millie, vivida por Dana Ivey com comicidade – mas mostrando resquícios de uma época de escravização.
O relacionamento de Millie e Sophia é um clássico burguês: a mulher branca, rica e preconceituosa, com arrogantes ares de estar permitindo que a mulher negra a sirva. É atual ao ponto de ser totalmente possível ter saído de “Que Horas Ela Volta?”, dirigido por Anna Muylaert em 2015.
Oprah poderia ser considerada um perigo para o protagonismo de Whoopi porque rouba a cena em todos os sentidos. É a voz da liberdade feminina contra a opressão masculina. Faz um dos discursos mais fortes do filme para resumir a trajetória de tantas mulheres negras ontem e hoje: “toda a minha vida eu tive que brigar”.
É por isso que não há concorrência de atrizes, porque é uma história de união feminina. Sofia e Celie mantém uma amizade distante até que a vida vai jogando as duas em um abraço refúgio das dores. É um dos poucos momentos de “eu me importo com você, eu entendo o que você sente”.
Esse carinho ganha contornos mais íntimos com a cantora e diva Shug Avery (Margaret Avery), com quem Celie tem um romance – que na adaptação do livro de Alice Walker para os cinemas se rendeu ao preconceito de seu tempo e pouco deu destaque a um dos fatos principais da obra original.
É para Celie que ela canta o clássico “Miss Celie’s Blues (Sister)” – um hino de empoderamento feminino. É para Celie que ela guarda os melhores momentos de afeto, de atenção, de cuidado – é quando ela se mostra como realmente é, expõe o seu melhor. Muito diferente de suas cenas com Albert, com quem tem um relacionamento amoroso e uma amizade.
A ligação de Celie e da irmã com a África coroa a história, traz a ancestralidade e é coroada em um lindo campo de flores de cor púrpura. Disponível na Claro TV.