“Uma Mulher Fantástica” oferece uma façanha de atuação emocionalmente multifacetada, nutrida com sensibilidade perfeita
Por Eduardo de Assumpção*
“Uma Mulher Fantástica” (Una Mujer Fantastica, Chile, 2017) é ganhador do Oscar de Melhor Filme Internacional. O longa chileno apresenta a história de Marina Vidal (Daniela Vega), garçonete, cantora de boate e namorada do maduro Orlando (Francisco Reyes). O diretor Sebastián Lelio percebe Marina exatamente como ela é neste retrato compassivo de uma mulher trans cujo luto por um amante perdido é obstruído a cada passo pelo preconceito e transfobia.
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Orlando, divorciado de 57 anos, é apresentado frequentando uma sauna escura no centro de Santiago, para depois estar em um jantar de aniversário romântico com Marina. Ele, naquela mesma noite, sofre um aneurisma fatal sofrendo ferimentos graves após uma queda. Uma vez que Marina relata ao irmão de Orlando que ele morreu na mesa de operação, ela corre em pânico do hospital.
Há uma cena em que Marina enfrenta uma tempestade, o que muito bem poderia ser uma analogia para a sociedade.
Ela pode parecer feroz em uma saia lápis de couro justa e uma gabardine, mas Marina não é uma femme fatale, ela é frágil: nada sobre sua identidade ou seu relacionamento com o falecido é vergonhoso ou falso, mas ela se vê tratada como uma impostora: pelos respondentes do hospital, que insistem em tratá-la por sua identidade de nascimento; por uma detetive da Unidade de Investigação de Crimes Sexuais, que a submete a uma humilhação física…
E pela própria família e ex-esposa de Orlando, Sonia, que reivindica direitos de luto primários e rotula Marina de “quimera”, enquanto tira tudo que Orlando lhe deixou. Marina deve arrumar uma maneira independente de dizer adeus e começar tudo de novo. Há uma cena em que Marina enfrenta uma tempestade, o que muito bem poderia ser uma analogia para a sociedade.
Ainda há uma sequência de dança em êxtase em uma boate gay, uma visão fugaz e idealizada da mulher que Marina ainda sonha em ser. Lelio ousadamente faz o uso literal da canção de Aretha Franklin “You Make Me Feel Like A Natural Woman” em um ponto-chave de sua protagonista. Entre suas múltiplas virtudes, o filme será lembrado por sua estatueta dourada e por uma atriz trans interpretando uma personagem trans.
Mas Vega oferece uma façanha de atuação emocionalmente multifacetada, nutrida com sensibilidade perfeita por seu diretor. Disponível na @netflixbrasil
*Eduardo de Assumpção é jornalista e responsável pelo blog cinematografiaqueer.blogspot.com
Instagram: @cinematografiaqueer
Twitter: @eduardoirib