Você para de sentir quando sai do personagem ou ser humano também é algo real na sua vida?
Um dos mais tristes males da atualidade talvez seja a sensação que o mundo passa, não sem motivos, de que precisamos nos proteger o tempo todo. E sim, precisamos, de muitas coisas, mas em qual nível? Nas ruas, sim, infelizmente, no trabalho, sim, infelizmente, mas e nos encontros da vida? Uma cruzada de olhares, um aplicativo, um esbarrar no metrô. O encontro é inevitável.
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Então o ser humano segue para a defesa, a partir do primeiro olhar se fecha, se protege do outro. Mas mesmo do outro que é carinho, e não pedras? Isso resulta em uma resistência, por exemplo, a ser sincero, se entregar ao que está sentindo. Gostou da pessoa que acabou de conhecer? Hum, melhor não mostrar empolgação, é preciso estar no comando. É?
Não se pode falar que gostou, não se pode perguntar se quer de novo (quem quiser que me procure, sou o máximo) e nem ousar cometer o hediondo crime de dizer algo seu, particular, assumido. O personagem não pode ser desmascarado (não?) neste teatro de insanidades e dificuldades, de obstáculos autocriados, de problemas procurados à exaustão sem motivo aparente.
Estamos tão grudados em uma realidade virtual – que caminha para um universo virtual com o metaverso e promete engolir todas as nossas humanidades – que esquecemos do que nos faz gente? Hétero, homo, bi, trans, cis, de qualquer raça, a gente sente, a gente quer, a gente precisa.
Mas parece mais fácil mascarar, disfarçar o sentimento em nome de uma defesa. Porque sim, a gente se machuca no amor também, a gente sofre, chora e tudo aquilo (eu amo fazer playlists musicais nestes momentos de picos emocionais), mas não podemos desistir do sentir, do ser, da subjetividade que nos faz ser quem somos.
Então nada de te dar meu telefone? Não posso perguntar o seu? Se eu perguntar, você vai se sentir muito metido, não quero. Precisa mesmo? Quer meu telefone? Não? Ok. Beijos. Simples assim. Não existe uma guerra, uma disputa por quem é mais desinteressado – pelo menos não quando a gente está interessado. Precisamos mesmo de tantos escudos contra o sentir?
Não há problema em criar um personagem (na Comunicação a gente chama essa idealização de Persona) para você, baseado no que você quer ser, algo para se sentir empoderado. Só não esqueça de que uma hora a peça acaba e todos da plateia vão para casa.
Você para de sentir quando sai do personagem ou ser humano também é algo real na sua vida? Você sai de cena? O medo de sofrer já é sofrer.
Cinco produções imperdíveis sobre encontros marcantes – tristes e felizes, como a vida:
“Serendipty”, de Peter Chelsom (2001)
“Sauvage”, de Camille Vidal-Naquet (2018)
“Citas”, vários diretores (2015)
“Traídos Pelo Desejo”, de Neil Jordan (1993)
“Blue Jasmine”, de Woody Allen, (2013)